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24/04/2009Violência - Nilzardo Carneiro Leão
24/04/2009Publicado na Folha de Pernambuco - 24.04.2009Sendo a violência um fenômeno complexo do universo social, suas causas devem ser analisadas sob múltiplos aspectos, a fim de serem obtidas soluções que permitam aceitá-la em nível de suportabilidade, visto como não foi nem é problema da sociedade contemporânea, embora ultimamente, por diversos fatores remotos ou próximos, que se foram acumulando no meio social brasileiro, venha se acentuando sob diversas formas, seja a urbana, seja rural, seja a praticada através de agressões físicas a pessoas ou grupos, seja através de ações profundamente afrontosas à ética inclusive por agentes do Poder Público e contra o erário da Nação.
A violência aparece, assim, como componente concreto da experiência cotidiana. Mais ainda: a violência passa a constituir na atualidade, em escala crescente, fenômenos centrais de percepção social e de dores e sofrimentos de grande parte da população, exteriorizando-se como uma força atuante incidindo sobre o cidadão.
Estruturas políticas e sociais permitiram e permitem que ocorra uma institucionalização da violência, onde o Estado é partícipe, na medida em que a ele compete cuidar, zelar, garantir, enfim dar segurança e um meio de vida mais digno e de tranqüilidade ao homem brasileiro.
Importante é distinguir a força interior do homem que o leva a caminhar na vida e buscar novos caminhos e novos momentos de ascensão social, daquela que nada constrói e até destrói, ou seja, a violência, que aparece tomada de mil disfarces e mesmo como componente diário. Desde a infância, faz-se uma habitualidade ao ódio e ao desamor ao próximo, mostrados nos filmes, nos valores negativos de conduta a que se dá valia, manipulados, destacados e exibidos como válidos.
O agir que se pode dizer agressivo é um componente do homem, enquanto mantido e dominado por valores sociais válidos, por uma ética, é necessário e impulsiona a sociedade para o progresso e novas conquistas. Rompidos, porém, os controles sociais e individuais, eis a violência em suas mil formas. “A violência é a caricatura, ou melhor, a filha decaída ou degenerada da força...” (George Sorel, “Réflexions Sur la Violence”).
O que se está a ver, na atualidade, é a violência aparecendo como um estilo de vida de que resulta a intranquilidade em que todos vivemos. As mudanças de valores e perda de padrões éticos, faz a transformação no sentido de o comportamento do homem se manifestar como o só viver o momento presente e atual. É que, já se disse, “um homem pobre é um pobre homem...”
O grave problema da violência está em como ela se modifica em sua densidade e intensidade, aparecendo sob múltiplas formas e fazendo diferenciadas vítimas: há a violência dissimulada a feita por textos legais para beneficiar determinados grupos; há a violência dos condicionamentos e a refinada e cínica; há a violência que escandaliza, servindo para esconder outros tipos de violência; há uma violência racionalizada e há uma violência subliminarmente praticada, todas pondo em risco as estruturas e o próprio Estado de Direito Democrático, na medida em que os valores éticos, morais e até os preceitos legais perdem validade social.
A violência representa sempre uma estrutura dialética de oposição dos contrários, fazendo parte de uma estrutura social distorcida e esgarçada que necessita de urgente reformulação. E como fenômeno central de percepção social, é preciso que se entenda também que os praticantes do crime não são de uma estrutura social diferente. Assim, se vai se tratar os mesmos com inimigos, de se ver que a visão “deles”, que estão “do outro lado”, também passarão a ver os “homens de bem” como inimigos, a quem não devem qualquer consideração. A consequência, estamos todos a sofrer.
Impõe-se investir a) naquele que cometeu o crime; b) naquele que está a caminho do crime; c) naquele que não se apresenta como possível criminoso; d) na infância e na juventude; e) naquele sobre quem recaiu o resultado da violência, a vítima.
É necessária a formação de uma nova consciência política, uma forma diferenciada de encarar um problema de tantas faces, uma visão realista dos governantes e da comunidade. Se assim não for entendido, a lei penal por si só, as ideias de “lei e ordem” e já hoje de um “direito penal do inimigo”, mais penas privativas, não diminuirão de forma alguma, a violência, para que ela se torne suportável para o homem e para a sociedade.