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31/03/2010Um livro de fôlego - Arthur Carvalho
31/03/2010Publicado no Jornal do Commercio - 31.03.2010Em priscas eras, embarquei, com meu pai, minha mãe e meus irmãos, daqui do Recife para Natal, num Ford V-8. Lembro bem que depois de passarmos por Goiana, João Pessoa e Mamanguape, entramos no chamado brejo da Paraíba, cruzamos Pipirituba, Guarabira e Bananeiras até adentrar o Estado do Rio Grande do Norte, pela cidade de Passa e Fica, depois Campestre, Riacho, hoje Tangará, Serra Caiada, Macaíba e Natal. No verão, com tempo bom, levava-se de carro, entre as décadas de 40 e 50, por estradas de barro ou areia, atolando sempre, de sete a oito horas, com as chuvas de inverno, e tudo alagado, de 9 a 10, 11 horas.
Essas viagens, principalmente em noite de lua cheia, me fizeram gostar da terra de Augusto dos Anjos. E leio tudo que me cai às mãos sobre suas cidades. Acabo de ler História política de Sousa (1945-2004), de Paulo Gadelha, pela Cepe. Desculpem o lugar comum: é desses livros tão honestos e bem escritos que não conseguimos interromper a leitura. O autor foi político (deputado estadual) na sua Paraíba, mas conseguiu dar o recado isento de paixões partidárias e ideológicas.
Trata-se de trabalho de pesquisas exaustivas e de fôlego. Começa com a formação dos partidos políticos de Sousa, as primeiras eleições do Estado Novo, conta porque Antônio Pinto de Oliveira não quis ser senador, refere-se ao rompimento de José Américo de Almeida com Agemiro de Figueiredo, à queda de João Goulart, à reeleição de Fernando Henrique e a outros fatos políticos de relevância histórica.
Lendo Gadelha, ficamos cientes do carisma e poder de liderança no cenário político contemporâneo da Paraíba, de um José Américo de Almeida, um Ruy Carneiro, um Zé Gadelha, um Antônio Maris, um Burity, um Humberto Lucena, um Wilson Braga e da família Gadelha de um modo geral.
Curioso o lance do autor na passagem de Juarez Távora pela cidade de Sousa, em julho de 1954. Demonstrando personalidade, desinibição, inteligência e dotes oratórios precoces, Paulo Gadelha saudou "o velho revolucionário", aos 12 anos de idade, convocando Sousa a fazê-lo presidente da República, pela UDN. Na ocasião, falaram ainda os deputados Ernany Sátiro e Alde Sampaio. Diz Gadelha que, no seu discurso, o General Juarez Távora lembrou a presença marcante da terra de José Lins do Rêgo na história da República, evocando o episódio de 1930, quando "a pequenina e heroica" tomou posição ao lado dos "jovens tenentes" e dos "oficiais verdadeiramente nacionalistas que queriam um Brasil melhor".
Tem razão o prefaciador Evaldo Gonçalves, da Academia Paraibana de Letras, quando diz tratar-se de um belíssimo ensaio sobre a sociologia e a política paraibana e nacional, em termos de cenário maior, no período estudado, com ênfase especial para as batalhas partidárias travadas em Sousa, "que, no dizer de José Joffily, há alguns anos, tornou-se um importante polo de influência dos destinos políticos da Paraíba, ao lado de João Pessoa e Campina Grande, privilegiada condição que preserva até hoje".
Meu saudoso tio Aloysio de Carvalho Filho, que você conheceu, gostaria muito de ter lido esse seu livro, Gadelha.
P.S. – Correspondência do procurador da República Lineu Escorel Borges, dizendo que Thomas Morus viveu de 1478 a 1535 e não no século 14, como afirmei na crônica Prato Frio aqui publicada. Com paraibano não se brinca...