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30/03/2010O defensor no processo criminal - Palhares Moreira Reis
30/03/2010Publicado na Folha de Pernambuco - 30.03.2010
O recente caso de Isabela Nardoni e o movimentadíssimo noticiário da parte externa do prédio onde estava funcionando o Tribunal do Júri, em São Paulo, bem demonstram que o populacho enfurecido com os réus em julgamento, não sabe distinguir entre estes e os advogados que os patrocinam.
Esquecem os integrantes da malta que, por mais hediondo que tenha sido o crime, o réu tem assegurado pela Constituição o seu direito de defesa: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5º, LV)
Zanardelli, sobre a defesa criminal, ensina: “Até o patrocínio de uma causa má é legítimo e obrigatório, porque a humanidade o ordena, a piedade o exige, o costume o admite e a lei o impõeö. O advogado criminal deve orientar o cliente e, como escreveu Manoel Pedro Pimentel, “respeitados os princípios da ética profissional, deve fazer tudo o que estiver ao seu alcance para que o seu constituinte seja defendido com a maior eficiência possível”.
Os advogados criminalistas (e o autor não é um deles, nunca foi, salvo nos anos de chumbo, defendendo os assim chamados “criminosos políticos”) têm de lutar pelos seus clientes, não só dentro do processo, mas para defendê-los, e defender-se da oposição de setores da sociedade que confundem suas ações com as de seus clientes. Não é verdadeiro dizer-se que o Advogado Criminalista limita-se a defender bandidos e soltar os criminosos que a polícia se esforça para prender.
A imprensa, no seu ramo sensacionalista, interpretando, diga-se, o sentimento médio da coletividade, não pretende perder o grande prato, pois o veículo no qual trabalha precisa circular mais e vender mais. Assim sendo, os ânimos se exacerbam, e a reação, nesse caso, toma feições, por vezes, até mais odiosas e odientas que o próprio crime, na exposição de Serrano Neves.
Por isso, foi com desprazer que tomamos conhecimento de que o advogado de Alexandre Nardoni e de Ana Cristina Jatobá tinha sido agredido pela multidão que, mesmo sem entrar no fórum, buscava hostilizar os réus e, por consequencia, o seu advogado.
Daí, a Ordem dos Advogados do Brasil, pelo seu Conselho Federal e pela Seção de São Paulo, emitiram nota em defesa da imunidade do advogado no seu exercício profissional, documento que deve ser divulgado para conhecimento de todos:
“As manifestações públicas de hostilidade ao pleno e livre exercício profissional da advocacia expressam equívoco a respeito do papel do advogado. O advogado não pode ser confundido com seu cliente. Não é cúmplice de seus eventuais delitos, nem está ali para acobertá-los. Seu papel é propiciar ao acusado plena defesa, circunstanciando-a com objetividade, dentro dos estritos limites da lei. Somente essa defesa, prerrogativa de qualquer cidadão, permite que se conheçam em detalhes todos os aspectos que envolvem a prática de um ilícito. Sobretudo, impede que a justiça se confunda com a vingança.
São esses fundamentos pilares do Estado democrático de Direito, conquista da civilização humana, que não pode se submeter a impulsos emocionais a se tornarem incompatíveis com os mais elementares princípios do humanismo e da liberdade individual. Todo cidadão tem direito a defesa, sem a qual não se cumpre o devido processo legal - e, por extensão, não há Justiça. Em vista disso, o Conselho Federal da OAB e a Seccional Paulista da OAB condenam os recentes acontecimentos ocorridos em São Paulo contra o advogado em seu exercício profissional, e pede ao público confiança na Justiça.” Márcia Regina Marchado Melaré - presidente em exercício do Conselho Federal da OAB - e Luiz Flávio Borges D’Urso - presidente da OAB/SP.