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08/04/2010Ínsula política - Fernando Araújo
08/04/2010Publicado no Diario de Pernambuco - 08.04.2010
fernandojparaujo@uol.com.br
Anos atrás, li em uma revista nacional de grande circulação que os cientistas haviam descoberto a ínsula. Tratava-se de uma pequena estrutura do cérebro humano, escondida numa das regiões mais recônditas. Do tamanho de uma ameixa seca, a ínsula trabalharia em parceria com outras duas estruturas cerebrais, o córtex pré-frontal e a amígdala. Ela funcionaria como uma espécie de intérprete do cérebro ao traduzir sons, cheiros ou sabores em emoções e sentimentos como nojo, desejo, orgulho, arrependimento, culpa ou empatia. Lembrei-me dela ao ler, em diversos jornais do país, que a bancada do "cansei" avança no Congresso. Pensei comigo que a ínsula política foi descoberta. São deputados e senadores desiludidos com a falta de produtividade do Legislativo e o alto custo das campanhas. A situação é lamentável, mas precisa ser interpretada dentro de uma perspectiva mais ampla. Em primeiro lugar, atribuamos parte dessa situação aos partidos políticos, que não estão sabendo aproveitar o momento democrático para se consolidarem como instituições fundamentais. Se não mais vivem o tempo da Facção Áulica ou do Clube da Joana, não deixaram de ser estruturas cartoriais. Louve-se uma ou outra atitude isolada, como a de André Régis, com os seus cursos de direito constitucional e cidadania, no Instituto Teotônio Vilela, órgão de estudos do seu partido.
Para mudar essa realidade e má fama partidária, é preciso dar mais vida aos partidos. Movimentar suas hostes. Torná-los verdadeiras escolas de política (com "p" maiúsculo), onde se possa preparar, adequadamente, os futuros governantes. Fazer com que em seu interior se discutam os grandes temas e projetos nacionais. É preciso incentivar a discussão ética em seu bojo. Acabar, de uma vez por todas, com essas estruturas autoritárias. E como diz Frei Betto, "por vezes corruptas, ainda que dissimuladas num democratismo que consiste em multiplicar o número de filiados para perpetuar a elite dirigente". Segundo, muitos dos que agora estão saindo deveriam fazer uma mea culpa, porque quando estavam na senda do poder, nada ou quase nada fizeram para mudar esse péssimo quadro político. Muitas vezes até se deixaram chamuscar na fogueira das vaidades.
Atitude decente, agora, antes de deixarem a vida política, seria votar ou apoiar quem votasse no projeto "ficha limpa", para extirpar da vida pública uma leva enorme de bandidos, gente que faz da atividade política balcão de negócios. Que ambiente, se não o dos partidos vão formar os jovens, como ensina Bobbio, que fazer política é manter viva a indignação e engajar-se em prol de mudanças que façam cessar a marginalização e a exclusão, e jamais aceitar a desigualdade social. Ainda bem que, em contraste com essa pregação de cemitério, vem de Minas uma voz firme em favor do fazer política, refiro-me à do ex-governador Aécio Neves, com seus 92% da aprovação, em entrevista à revista Veja (edição 2159, 7.4.2010): " A política, em si, é a mais digna das atividades que um cidadão possa exercer. Os gregosdiziam que a política é a amizade entre vizinhos (...). Vou lutar por reformas que possam tornar a política de novo atraente para as pessoas de bem (...), um trabalho empenhado na elevação dos padrões materiais, sociais...". E finalizou: "É assim que vamos empurrar os piores para fora do espaço político...". É isso.