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29/03/2010Destruição e vida - João Bosco Tenório Galvão
29/03/2010Publicado no Diario de Pernambuco - 29.03.10
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Nos últimos dias a curiosidade nacional em sua ótica mórbida contemplou e contempla o julgamento do assassinato da menina Isabella. Sendo, hipoteticamente, reconhecido o casal Nardoni como os assassinos o caso ganha mais interesse, pois em seu bojo a destruição (morte) de Isabella é mais curiosa, ou seja, cruel. Intensa, pois foi a destruição de uma vida nascente. Cruel pelos autores da destruição. A humanidade se comporta, nas ruas de São Paulo, como os romanos e visitantes do Império de César, ao sentir o prazer de contemplar a destruição da vida de escravos ou prisioneiros de guerras, flagelo vital de frágeis vítimas das idiotices urbanas e humanas. A contemplação da destruição da vida, de bens, ou das tragédias que eventualmente assolam os indivíduos, desperta os apetites necrófilos de nós mortais. Afinal o que dá pra chorar dá pra rir. Vejam os inúmeros leitores (eu me superestimo), que a juventude brasileira ganhou, há poucos dias, a copa do conhecimento competindo com países dos primeiríssimos mundos. A TV brasileira quase que não noticia o evento que significa, sobretudo, vida. Em oposição, o noticiário da morte e o julgamento dos pais de Isabella predominam nos noticiários das TVs, rádios e jornais, é a morte como notícia. Por falar nela, o comércio nos cemitérios e arredores é bastante significativo para a economia, enquanto nos arredores das maternidades nem tanto. As rosas, os lírios e as orquídeas enfeitam mais o crepúsculo humano do que o seu nascer. Programas de TV e rádio crescem em audiência com a exposição de mortes e aberrações. Destruições e desgraças.
O que importa é o crescimento do índice de audiência vendendo cervejas, bolachas e outras coisitas. Se o programa exibe nosso aprimoramento industrial, o nosso crescimento econômico, a queda da mortalidade infantil, a diminuição de nossas diferenças, não faz o Ibope crescer. Tem que ter sangue, morte, destruição. Todo esse processo de cobertura da mídia é bom. Bom no sentido de ser melhordo que sua ausência, com a mutilação da liberdade de investigar, informar e formar a opinião do público. O defeito está no exagero, na excessiva valorização da informação nefasta. Pois o que é ruim não precisa de intenso destaque, mas, de forma simples, ser informado para quem precisa sofrer alertas. Os detalhes sórdidos que dão prazer aos necrófilos e aterrorizam os amantes da vida sem sobressaltos são desnecessários, a informação do mal como meio de destruição da vida deve ser feita, sem os excessos que banaliza as torpezas, nivelando as atitudes boas com as ruins, pois de tanto ver comportamentos insanos predominando no noticiário se pode chegar à conclusão de que a insanidade é que é o padrão de normalidade. A beleza das rosas não se encontra nos velórios e sim em suas formas e nos perfumes que elas exalam. A beleza dos acontecimentos humanos se encontra mais no surgimento da vida do que no seu desaparecimento. A valorização do noticiário de nossas mazelas pessoais e coletivas há de ser contida pelo aprimoramento de nossa civilização. A vida é que deve ser exaltada sem limites.